sábado, 3 de março de 2012

Bibliotecas Escolares Entre a Expectativa e a Realidade

Não é só em termos históricos que a Biblioteca cruza o seu destino com o da Escola mas também em termos conceptuais e sistemáticos. Espaço de protecção do saber, também grande armazém de aprendizagem, espaço ordenado com vista à leitura, ao estudo, à sociabilidade entre gerações, toda a biblioteca tende a ser uma Escola. O conceito de biblioteca é um conceito dinâmico; passando de uma caixa onde se guardavam livros a «uma colecção organizada de livros e de publicações em série e impressos ou de quaisquer documentos gráficos ou audiovisuais, disponíveis para empréstimo ou consulta» (Magalhães, 1994) ou «um organismo ou parte de uma organização cujo objectivo principal é organizar colecções, actualizá-las e facilitar através do pessoal especializado, o acesso a documentos que respondam às necessidades dos utilizadores, nos aspectos de informação, educação e lazer» (Faria, 1988) ou, ainda, «uma instituição organizada de livros impressos e revistas ou de qualquer classe de material gráfico ou audiovisual, seus materiais segundo as necessidades de informação, investigação, educação e recreação dos seus utilizadores. Uma biblioteca é uma instituição que sabe as necessidades informativas da sociedade, exercitá-las quando é preciso» (UNESCO, 1994). Veiga et al., entendem por biblioteca escolar «o espaço e os equipamentos onde estão armazenados todos os tipos de documentos de informação que fazem parte dos recursos pedagógicos a serem utilizados em actividades lectivas, ocupação de tempos livres e de lazer». De acordo com este conceito, a biblioteca escolar é parte integrante do processo educativo. Ela é essencial a qualquer estratégia a longo prazo nos domínios da literacia, educação, informação e desenvolvimento económico, social e cultural. Sendo da responsabilidade das autoridades locais, regionais ou nacionais, a biblioteca escolar deve ser apoiada por legislação e políticas específicas. Deve ter meios financeiros suficientes para assegurar a existência de pessoal com formação, documentos, tecnologias e equipamentos e ser de utilização gratuita. As bibliotecas escolares são geralmente reconhecidas como sendo um elemento fundamental de dois sistemas de um país: o sistema educativo e o sistema de informação. No entanto há quem afirme que têm sido e continuam a ser o parente mais pobre do conjunto de bibliotecas do país. Organizações internacionais de grande prestígio como a UNESCO e a IFLA têm-se debruçado sobre este tema e, ao longo dos últimos quinze anos, produzido um importante conjunto de estudos e documentos. Dois dos mais importantes documentos são o Manifesto da Unesco sobre Mediatecas Escolares e os Princípios Orientadores para o Planeamento e Organização de Bibliotecas Escolares. Estes documentos constituem hoje um corpo teórico essencial para o desenvolvimento dos serviços de bibliotecas escolares em qualquer país. «A biblioteca escolar proporciona informação e ideias fundamentais para sermos bem sucedidos na sociedade actualmente baseada na informação e conhecimento» (Manifesto da Biblioteca Escolar). A biblioteca escolar desenvolve nos alunos competências para a aprendizagem ao longo da vida e estimula a imaginação permitindo-lhes tornarem-se cidadãos responsáveis. Numa sociedade de informação, em que alguns dizem já estarmos a viver, onde os maiores problemas de quem lida com a informação são como recolher, organizar, sistematizar e tornar acessíveis milhões de dados que diariamente são produzidos em todo o mundo, as bibliotecas têm um papel fulcral no nosso sistema de ensino e são cada vez mais chamadas a desempenhar novos papéis. Reconhecendo lacunas existentes neste domínio, os Ministérios da Educação e Cultura lançaram o programa «Rede de Bibliotecas Escolares» com a pretensão de criar bibliotecas actualizadas em todas as escolas do país. Essas bibliotecas, são concebidas como «centros de recursos multimédia de livre acesso, que englobem um conjunto significativo de livros, programas informáticos, periódicos, registos vídeo e áudio, diapositivos, CD-ROM, etc, dispondo de espaços e equipamentos onde são recolhidos e disponibilizados todos os tipos de documentos» (Alçada, 1996). Consideram-se as bibliotecas como espaços de promoção do livro ou relicários do conhecimento humano, locais de partilha cultural ou santuários da civilização, o certo é que elas se assumam, cada vez mais, como baluarte da vida democrática: “a biblioteca pública é a porta local de acesso ao conhecimento e à informação, proporcionando as condições básicas para uma aprendizagem contínua, para uma tomada de decisão e para o desenvolvimento cultural dos indivíduos e dos grupos sociais” (Manifesto da Unesco, 1972). Ao proporcionar fontes de conhecimentos e ao contribuir para a afirmação do indivíduo na comunidade, as bibliotecas assumem uma dupla finalidade, elas são simultaneamente factores de desenvolvimento cultural e social. Face à concorrência dos audiovisuais, o prazer da leitura pela leitura, fonte de descoberta e imaginação, tem vindo a perder gradualmente adeptos. O fenómeno da iliteracia, resultado de uma Escola em crise ou de uma sociedade que não corresponde com equipamentos culturais apelativos, evidencia-se hoje como preocupação social. É necessário que, ao mesmo tempo que se investe na educação, se criem condições para o desenvolvimento e integração das competências e dos conhecimentos que na Escola se adquirem para que não se corra o risco de gerar situações de retrocesso que poderão recair no “analfabetismo”, desperdício evidente de todo o investimento da comunidade na formação dos seus membros. Interessa pois conhecer o público utente das bibliotecas, público sem dúvida mais motivado para a leitura, e tentar perceber quais os seus interesses e necessidades para que se possam redefinir objectivos e adequar procedimentos, numa tentativa de o manter e de conquistar novos sectores da população. Os estudantes devem ser encaminhados para um aprender toda a vida, o que hoje é verdade, amanhã é posto em causa, como refere Umberto Eco, fazer com que a «Escola ensine para a Biblioteca», uma vez que o principal objectivo da biblioteca escolar é, hoje, «orientar os estudantes de modo a que estes aprendam a manusear a informação na sua vida futura». Cristina Correia*
*Professora Bibliotecária.